quinta-feira, março 31, 2016

Sexualidade, Gênero e Educação: desafios éticos em tempos de recrudescimento fundamentalista.

Em junho de 2015, a maioria dos 5.570 municípios brasileiros aprovou seus Planos Municipais de Educação (PME) ao final do prazo previsto no Plano Nacional de Educação (PNE). O processo de construção dos planos inclui diversas etapas, desde a formação de comissões de trabalho para elaboração de um diagnóstico local até a construção de uma lei por meio das casas legislativas, a qual é sancionada pelo poder executivo. Convém apontar que os documentos de abrangência municipal precisam estar alinhados às políticas de educação dos respectivos Estados e, certamente, aos parâmetros curriculares nacionais. Ocorre que nesse ano, os planos municipais de educação foram alvos de pressão política exercida por setores conservadores e fundamentalistas da sociedade civil. Líderes religiosos, políticos das bancadas cristãs e seus pares defensores do fundamentalismo, corrente conservadora que enfatiza a interpretação literal da Bíblia para princípios básicos e obediência; pressionaram as comissões de trabalho a excluírem o termo “gênero” dos planos de educação, justificando serem contra uma “ideologia de gênero”, como assim nomearam. Na realidade, um contrassenso semântico e discursivo, a ser explicado no presente ensaio.

Continuar a leitura, clique aqui. Revista Psicologia. Especial Sexualidade. Editora Mythos, 2016. 


quarta-feira, março 23, 2016

Parque Natural Municipal da Gruta: Morrer para germinar?

Fotografia. Joviniano Netto, 2015. 
Caros leitores, como podemos aceitar essa postura destrutiva que nos reduz a dicotômica parte contraposta à natureza? Será preciso morrer para germinar?  Essa nossa renúncia coletiva diz de uma forjada divisibilidade entre nós, humanos, e o meio ambiente.  E dessa forma, morremos todos.  
Há anos acumulamos uma série de denúncias, processos, requerimentos, projetos, trabalhos e textos acerca do Parque Natural Municipal da Gruta. Paralelamente, como temos mostrado por meio de registros fotográficos compartilhados nas redes sociais, transformamos a maior unidade de conservação de Americana num lixão a céu aberto. O Parque, ainda resquício de Mata Atlântica e cenário ímpar por sua formação geológica e nascentes, é destruído pela população e obras públicas. 
Os crimes ambientais são graves e vergonhosos para uma cidade de médio porte como Americana. Construção de logradouros, desmembramentos de lotes nos arredores, despejo de esgoto e entulho na área, erosão, ocupações irregulares, desmatamento do resquício de Mata Atlântica, mortalidade da fauna local e problemas de saúde pública. 
Nos últimos meses, junto ao coletivo Amigos da Gruta, temos articulado uma série de iniciativas no Parque, inclusive pressionando o poder público a cumprir o básico de suas responsabilidades. O executivo tem feito algumas ações, a passos lentos e limitado.  E ainda alguns políticos tentam aproveitar a carona. 
Bem, eis que em meio aos trabalhos de conscientização ambiental, pesquisa, encontros e conversas com as comunidades do entorno, nas últimas visitas, identificamos novos focos de despejo de esgoto sem tratamento no local. O Departamento de Água e Esgoto parece aguardar a construção da nova estação de tratamento da Balsa, uma obra parada. Lastimável tamanha irresponsabilidade ambiental, um crime. Nesse cenário, me assusta a indiferença do Ministério Público que, mesmo recebendo nossas denúncias, não move qualquer ação por conta do mau gerenciamento do Parque. As autoridades públicas, sobretudo do DAE, devem ser responsabilizadas. 
Com efeito, infelizmente, Americana não merece o título de município Verde-Azul. Aliás, surpreende termos tido esse selo, haja vista o descarte de esgoto sem tratamento numa área com afloramentos do Aqüífero Tubarão, sedimentação de arenito e queda d’água de 18m de altura. Independentemente dos problemas e reformas na estação de tratamento de Carioba, bem como os bons projetos de educação ambiental, como alegam os técnicos, a titulação não pode ser conferida diante dessa negligência grotesca com a principal unidade de conservação de proteção integral da cidade.   
Como diria Gilberto Gil, na música Drão, há que se plantar nalgum lugar, ver ressuscitar no chão, nossa semeadura. 

sexta-feira, março 18, 2016

Subjetividades privatizadas e cooptadas

*Texto originalmente encaminhado como colaboração ao Portal Novo Momento e ao jornal O Liberal

Caros leitores, mais triste que a polaridade política na qual nosso país atravessa, é perceber como nossas subjetividades, sentidos construídos na leitura do mundo, estão cada vez mais privatizadas e cooptadas pelos interesses das grandes oligarquias políticas e econômicas mundiais. Isso não é teoria da conspiração e sim a formatação geopolítica de poder e imperialismo internacional.
As pessoas acostumadas a não participarem da vida pública, pois não acompanham os trabalhos nas casas legislativas, nunca visitam as câmaras e assembléias, não interferem na realidade local, nunca são propositivas diante dos conflitos cotidianos que se registram na cidade, eximem-se de suas responsabilidades cidadãs, enfim, são alienadas em suas subjetividades privatizadas. Acreditam apenas em suas percepções pessoais, baseadas em suas vidas privatizadas, fechadas em si mesmas e em tudo que cerca seu reduzido campo de observação e consciência. Não há espaço para uma visão holística, da totalidade.
Nesse sentido, são facilmente cooptadas pelas grandes instituições manipuladoras da opinião pública, como as grandes mídias, também oligarquias que historicamente estão ligadas ao terrorismo e violência de Estado. Essa massa absorve uma consciência política forjada, um raciocínio tão limitado que não compreende a complexidade da vida em sociedade. Complexo porque são vários elementos e variáveis implícitos e correlacionados, ora em choque, ora alinhados, que qualquer resposta rápida e objetiva para o cenário político é um reducionismo grotesco.
Como podemos acreditar num discurso mentiroso de anticorrupção? O que surpreende é a falta de coerência e sensatez, haja vista que os argumentos não se sustentam contextualizados na história e na vida prática coletiva, tal como nos inúmeros casos de sonegação, subornos e desvios de verbas públicas, como temos assistido em nossa cidade.
Sugerir que os problemas nacionais são culpa de um partido ou alguns parlamentares é ingenuidade ou perversidade misturada à irresponsabilidade ética, quando num sistema democrático há diversas coligações, ações intersetoriais e perenidade entre sociedade civil e poder público. Mais que isso, o que choca é a renúncia coletiva em cuidar do público e bem comum cotidianamente, não apenas em manifestações performáticas.

Posto isso, prestemos atenção: esse golpe midiático é uma afronta à soberania nacional, e o pivô dessa convulsão social não é a operação Lava-Jato em si, mas o interesse internacional no Pré-Sal, conforme nos lembra a professora e filósofa Marilena Chauí. Olhemos as inferências no Oriente Médio nos últimos anos ao invés de nos focarmos em nossas subjetividades privatizadas.