segunda-feira, janeiro 18, 2021

Turismo Pós-pandemia: vai voltar, mas será diferente.

O impacto ainda está sendo estimado, visto que a pandemia e suas consequências seguem em curso. Já sabemos que a paralisação do turismo e a recessão econômica têm ocasionado o fechamento de empresas, perda de empregos, aumento do trabalho informal e, por consequência, a precarização da vida. Tudo isso tende a agravar problemas sociais no Brasil, o que impactará na saúde das pessoas e destinos. E o turismo é, antes de qualquer coisa, um fenômeno social, ou seja, os fluxos de pessoas dependem de variáveis culturais, comportamentais e expectativas pessoais. A percepção de segurança, a priorização de necessidades e a busca por resignação ou superação de uma pandemia deve influenciar nas dinâmicas do setor. Nesse sentido, uma tendência é o desenvolvimento local, processos de enraizamento e valorização da arte, cultura e ambiente em resposta a atual conjuntura de destruição, descontinuidade e desconstrução, que não são apenas em consequência da pandemia, mas também da economia e da política. Não há segredo, a recuperação após termos uma segurança sanitária será gradual, conforme recuperemos o poder de consumo e o bem-estar social. E, para mim, o melhor caminho é se associar e positivar a cultura e o ambiente.

O turismo de férias vai, em algum momento, voltar. Mesmo que demore alguns anos, as pessoas vão viajar. Em relação ao setor MICE (congressos, conferências, seminários etc.), alguns podem mudar, outros não. Talvez em um primeiro momento, em resposta à recessão econômica, seja uma alternativa vantajosa financeiramente, contudo, não me parece que seja uma tendência a qualquer público e setor. Ter um desempenho bom e eficiente não necessariamente supera as expectativas do público e o fideliza, promove networking, etc. Talvez algumas palestras e negociações se adequem bem a esse modelo, visto que a mediação é limitada e muitos querem apenas prestigiar ou consumir. Já as conferências, feiras e eventos que pressupõem uma maior interação e apelos semióticos, bem como diferentes linguagens não devem se limitar ao ambiente virtual, pois restringe a experiência de seu público. Além disso, alguns rituais não são meras formalidades, eles agregam valor como, por exemplo, os coquetéis e os serviços agregados que possibilitam experiências.

Antes da pandemia notávamos que os hotéis estavam lançando marcas e serviços com apelo para o lifestyle, para o compartilhamento, para a reunião das pessoas. Já as empresas aéreas estavam colocando cada vez mais gente dentro de um avião. Isso pode mudar a curto prazo, mas acredito que com o tempo isso seja retomado. O mais difícil será recuperar as condições sociais para tanto. Somos seres socializáveis, sempre nos deslocamos e atualmente um conjunto de imagens potencializam esses desejos. A socialização, a experimentação e as viagens estão num período de latência. E ao que tudo indica, dentre os diversos estilos de vida, um aspecto parece ser comum entre todos: congregar a conexão, o ambiente e aquilo que realmente importa, nossos afetos. Além disso, cada empresa terá o desafio de definir seu posicionamento, considerando a sensibilidade aos preços, perfil de seus consumidores, dentre outros fatores que já conhecemos.

Estamos numa fase de constantes mudanças e agravamento de crises econômicas, ambientais e sociais. Possivelmente - e assim desejo - o turismo seja um horizonte construtivo diante de tanta destruição, de modo a estabelecer pontes entre essas dimensões. Para tanto, a iniciativa privada, o Estado e a sociedade civil precisam estar integrados neste projeto. Em meio a tantas perdas e lutos, precisamos germinar o novo, acreditar na potência da vida e pessoas, valorizando-as na prática, cotidianamente, no desenvolvimento de uma atividade ética e justa, visto que o turismo une sonhos, trabalho, tempo e ambiente. E a pandemia nos convida a olhar para tudo isso.


*Texto enviado como contribuição à Agência de Notícias Brasil-Árabe 

Fábio Ortolano é docente no Senac Aclimação, bacharel em Turismo, mestre em Mudança Social e Participação Política e doutor em Psicologia Social.