domingo, outubro 07, 2018

A velha disputa nacional forjada de mudança


© AFP 2018/ Nelson Almeida
O Brasil desde a colonização vive três disputas: moral, econômica e fundiária, todas elas mediadas pela violência. Foi assim com os indígenas, com os negros escravizados e com aqueles que se opuseram aos padrões normativos. Hoje, se reproduz nas periferias urbanas, no campo e áreas naturais, nos trabalhos precarizados e direcionadas às minorias políticas (Mulheres, LGBTs, Indígenas, Negros, Pessoas com Deficiência e Refugiados).

Involuntariamente, eu acompanho o Bolsonaro desde 2011, quando, inclusive, escrevi um texto aqui sobre as semelhanças dele com um parlamentar estadunidense da década de 1970. Desde sempre medíocre, mentiroso e antiético.

Bolsonaro representa esse projeto de violência e privilégios que sustenta o país mais desigual do mundo e eu explico o porquê.

Primeiro, sua perversidade moral: diante de um avanço progressista, em 2011, ele inventa uma série de mentiras sobre um material contra homofobia do Ministério da Educação e, em 2018, reforça a mentira em rede nacional, usando uma publicação estrangeira. Defende abertamente a tortura, a violência contra LGBTs e mulheres, inclusive fazendo apologia ao estupro, e já se referiu aos quilombolas e negros como vagabundos, classificando-os como gados. Tudo isso gravado e compartilhado em mídias sociais. E, pasmem, dissimula.

Segundo, a conveniência econômica. Por que ele faz sinal de tiro com crianças de colo? Pois, representa os interesses das empresas armamentistas. A liberação das armas, além de acirrar a violência pública e matar pessoas inocentes, representa um mercado promissor e altamente lucrativo às empresas privadas. Também recebe apoio de empresários, como o líder do Grupo Havan, que coage funcionários a votarem em seu candidado. Um grupo em franca expansão, congregando mais de cem lojas de departamentos, bem como outros empreendimentos de geração de energia elétrica, postos de combustível e hotelaria. De fato, não está preocupado se é o PT que estará no poder, pois mesmo na gestão desse partido o grupo ascendeu, e muito, trata-se dos interesses em otimizar os lucros, precarizando o trabalho e as leis trabalhistas. E Bolsonaro já votou à favor da reforma trabalhista de Temer.

Terceiro, a questão fundiária. Ele defende a revogação das terras indígenas e a destruição de Unidades de Conservação. Estamos aniquilando culturas tradicionais e destruindo ainda mais biomas ameaçados de extinção, ecossistemas da Mata Atlântica e Cerrado, bem como a maior floresta do mundo, a Amazônia, perdendo espaço para soja e alimentos transgênicos e ele ainda defende a revogação de áreas protegidas. Ele não está sozinho, as empresas nacionais e internacionais de mineração estão com ele, o apoiam, e os impactos nós vimos recentemente com o maior crime ambiental da nossa história, a avalanche de lama com rejeitos de minérios, causada pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG).

São as mesmas disputas que se reproduzem desde o Brasil colônia e hoje são camufladas numa retórica de mudança. Bolsonaro se diz diferente dos outros políticos. Ele tem 27 anos de vida política, quase 03 décadas e nunca fez qualquer mudança, apenas enriqueceu. Nunca fez qualquer projeto de lei anticorrupção, nunca! Em tantos anos aprovou dois projetos, dois! E mais, confessou ter recebido 200 mil da JBS, é acusado de ter funcionária fantasma, receber propina de campanha, de nepotismo e usou auxílio moradia tendo com casa própria. Reproduz a herança política junto aos seus familiares e o fisiologismo político, ou seja, toma decisões em benefícios privados ao invés do bem comum. Não à toa, se sustenta nas bancadas mais fisiologistas do Congresso Nacional, a da bala, do agronegócio e da bíblia, a velha tríade do poder.

Imagem do clipe Perfeição, Legião Urbana.
Escrevendo esse texto, escutei fogos em comemoração ao resultado da eleição no primeiro turno, na qual ele foi o presidenciável mais votado. Lembrei da música “Perfeição”, da Legião Urbana. “Vamos celebrar nossa bandeira, nosso passado de absurdos gloriosos. Tudo que é gratuito e feio, tudo o que é normal. Vamos cantar juntos o hino nacional (...) Vamos festejar a inveja, a intolerância, a incompreensão. Vamos festejar a violência e esquecer a nossa gente que trabalhou honestamente a vida inteira e agora não tem mais direito a nada”.


Para saber mais:

É #FAKE que livro citado por Bolsonaro no JN é o que aparece com carimbo de escola de Maceió (G1)
https://g1.globo.com/fato-ou-fake/noticia/2018/09/04/e-fake-que-livro-citado-por-bolsonaro-no-jn-e-o-que-aparece-com-carimbo-de-escola-de-maceio.ghtml

Mineradoras, agronegócio, armas e 'indústria da fé' bancam Bolsonaro (Rede Brasil Atual)
https://www.redebrasilatual.com.br/politica/2018/10/mineradoras-agronegocio-armas-e-igrejas-financiam-bolsonaro

Bolsonaro ensina criança imitar arma com a mão (O Globo)
https://oglobo.globo.com/brasil/bolsonaro-ensina-crianca-imitar-arma-com-mao-22905093

Ao explicar R$ 200 mil da JBS, Bolsonaro admite que PP recebeu propina: “qual partido não recebe?” (Jovem Pam)
https://jovempan.uol.com.br/programas/ao-explicar-r-200-mil-da-jbs-bolsonaro-admite-que-pp-recebeu-propina-qual-partido-nao-recebe.html

Análise da emergência do comportamento fascista. Luiz Eduardo Soares, antropólogo, cientista político e escritor. 







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