quinta-feira, maio 02, 2013

Para o armário, nunca mais! – União e conscientização na luta contra a homofobia


        

         Anteontem ensaiávamos a valsa de debutantes e logo amanhã já completaremos a maioridade. Hoje, aos 17 anos, novamente vamos às ruas para mostrar que ainda temos fôlego para dizer do que nos cala e nos põem a dizer cotidianamente. 
            O Uruguai aprova o casamento homoafetivo, a França torna-se o 14º país a reconhecer igualdade plena entre casais heterossexuais e homossexuais, São Paulo oficializa o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e autoridades de Uganda discutem um projeto de lei sobre a união homossexual. Marco Feliciano, deputado acusado de racismo e homofobia, é pauta nacional e alvo de protestos em várias partes do mundo por ser eleito presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. Daniela Mercury assume seu relacionamento com outra mulher. Empresas nacionais associam suas marcas à igualdade mostrando-se a favor do casamento igualitário. Um movimento pelas redes sociais surpreende positivamente: grupos de grandes times de futebol dizem não a intolerância. 
            Se por um lado notamos as mudanças, por outro, observamos as respostas reacionárias às transformações. A frente conservadora, liderada por fundamentalistas religiosos, ascende nas casas legislativas Brasil a fora. Parlamentares encaminham projetos de leis contrariando-se a laicidade do Estado. Internautas, sem qualquer compromisso ético, compartilham depoimentos preconceituosos, sexistas, machistas, homofóbicos e fascistas. Apesar de uma pesquisa do instituto Ifop apontar que 63% dos franceses apóiam o casamento homossexual, centenas de pessoas foram às ruas em protesto contra uma lei que garanta tal direito. Autoridades de Uganda, mesmo com a pressão internacional e de seus próprios cidadãos pelos direitos de homossexuais, realizam discussões de portas fechadas. No IV ato contra Feliciano, na capital paulista, um jovem sozinho atira uma garrafa de coca-cola cheia contra centenas manifestantes que estavam nas ruas. 
            O que leva tantas pessoas saírem de suas casas contra uma lei que garanta o direito a outrem? O que lhes interessa e afeta? De que coragem se vale um sujeito que, individualmente, agride um coletivo? Como se confere o ímpeto em julgar-se mais assertivo, justo e correto que todos os demais? Por que, ainda hoje, discutem-se pautas de interesse comum à surdina? Será que o intervencionismo religioso atroz não está preso a um período histórico, como a Idade Média?
            Se prestarmos atenção no cotidiano, o ataque e violência sobre sujeitos acontecem quando estes já estão desqualificados socialmente. Foi assim que se estabeleceu e tem se mantido a violência nas penitenciárias, a subalternidade dos negros, a agressão doméstica de mulheres, a exclusão dos imigrantes e a violação de direitos de homossexuais, sobretudo colocando-os nas selas, nos campos de concentração, nas cozinhas, nas senzalas e nos guetos, no lugar do não-dito, do invisível, para que sem história e memória não fossem e nem sejam dignos de respeito e direitos. Falamos de sujeitos e minorias que, historicamente e moralmente, são inferiorizados, silenciados e desprestigiados socialmente. Repetimos tais retóricas, pois ainda que consideremos os avanços, não superamos as desigualdades históricas.
            Não podemos negar a existência do abuso de poder e da punição arbitrária daqueles que já são marginalizados pela pobreza. Não é possível que desconsideremos o alto índice de agressão que mulheres são acometidas em suas casas por seus próprios cônjuges. Não é sensato que continuemos a banalizar a dor daqueles que, próximos ou distantes, sofrem por serem refugiados e imigrantes. Não dá mais para fecharmos os olhos diante das falas racistas ao discutirmos cotas raciais. Não podemos apagar os números da violência homofóbica no Brasil. 
            Tudo isso compreende um discurso e história oficial compartilhados hegemonicamente e não podemos estar apáticos ao que nos oprime. As realidades e verdades são múltiplas, próprias de cada um, mas o registro e memória têm sido daqueles que têm o direito em defender a sua voz.        
            Aquele rapaz que, sozinho, agrediu um coletivo, trazia consigo todos esses discursos e histórico de opressão que invisibilizam sujeitos. A ponto de entender-se superior e forte o bastante para atacar. Ele não agiu sozinho e não foram apenas os franceses que o encorajaram e legitimaram, mas Feliciano, Bolsonaro, Silas Malafaia, etc. 
            Contudo, há de se pontuar também as glórias. Marcos Feliciano nos uniu! Mulheres e homens; negros e brancos; heterossexuais e homossexuais; brasileiros e estrangeiros; militantes, partidários e apartidários se somaram nas ruas de capitais, das cidades interioranas, e até fora do país, para dizer que “A nossa luta é todo dia, contra o racismo, o machismo e a homofobia”. Por isso, não se trata apenas de sua permanência, mas de históricos de militância pelos Direitos Humanos e pela promoção de minorias.
            Assim, reforçamos o Direito à Igualdade e o Direito de não sofrer privação arbitrária da liberdade. Marchamos para reivindicar que o Estado brasileiro cumpra com os princípios de Yogyakarta, conforme documento publicado, em 2006, pela ONU – Organização das Nações Unidas.   Pois, não admitimos mais o gueto e a subalternidade. Para o armário, nunca mais! – União e conscientização na luta contra a homofobia.


Fábio Ortolano. Assistente de comunicação da APOGLBT e mestrando em Mudança Social e Participação Política pela USP. Pesquisa as concepções de Sexualidade e Direitos Humanos de participantes das Paradas LGBT de São Paulo e Campinas.

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