Não é à toa que a pauta da
reforma – nos termos mais apropriados, a destruição - da previdência saia na
seção de economia e não de política na grande mídia. Uma das primeiras matérias
publicadas no portal UOL, que aborda como cada deputado federal votou no
primeiro turno, curiosamente, traz na mesma página especulações financeiras e
oscilações de valores das moedas. Tal reforma forjada, de fato, é mesmo mais
uma questão econômica e financeira do que propriamente política, do interesse
cidadão e do bem comum. Ela visa a transformar direitos em produto de mercado,
garantias sociais em itens de lucro e especulação financeira.
Há muito tempo as elites
econômicas tentam nos convencer da lorota que existe um déficit na previdência.
Elas mesmas usurpam dos recursos e depois deturpam a realidade novamente em
benefício próprio. Desde a promulgação da Constituição Cidadã, de 1988, buscam
derrubar os direitos sociais previstos nela. Numa matéria publicada em 27 de
julho do mesmo ano, no Jornal Folha de São Paulo, José Sarney, presidente à
época, aponta um déficit na Seguridade Social, justificando uma
ingovernabilidade do país, dado este diferente do apontado pelo ministro da
previdência na ocasião.
A Seguridade Social compreende os
direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. O orçamento é
composto por contribuições de trabalhadores, de empresários e por repasses de
tributos do Estado.
O Relatório final da CPI da
Previdência de 2017 evidencia que não existe déficit. Mostra que, na realidade,
dentre alguns fatores, o rombo se dá tanto por dívidas, desvios e sonegações
quanto por desonerações de empresas e pela DRU (Desvinculação de Receitas da
União), a qual possibilita retirar atualmente até 30% dos recursos da
Seguridade Social para investimento em outras áreas, como o pagamento dos juros
da dívida pública, que por fim acaba transferindo esses recursos aos bancos. Em
2013, foram mais de 113 bilhões desviados da S. Social via DRU, segundo dados
oficiais, publicados pela Associação Nacional dos Auditores-fiscais da Receita
Federal do Brasil (ANFIP)[1].
A mesma CPI aponta que empresas privadas devem R$ 450 bilhões à Previdência,
segundo portal do Senado[2].
O déficit é um dos principais
argumentos utilizados pelo governo e outros defensores da reforma da
previdência, contudo, segundo a ANFIP, por conveniência, esse argumento oculta
receitas e incha artificialmente as despesas para tramar seu resultado. Querem
que os trabalhadores paguem a conta de tantos desvios, politicagem, sonegações
e dívidas de empresas.
Como podem aprovar a desoneração
de 83 bilhões de ruralistas, não cobrar a dívida de bancos e empresas privadas,
tal como a Havan, que deve 168 milhões para Receita e ao INSS[3]
e, ao mesmo tempo, imporem aos trabalhadores com diferentes expectativas de sobrevida (que calcula o tempo de vida após as pessoas se aposentarem) o aumento
do tempo mínimo de trabalho? Na prática, alguns
trabalhadores nunca irão se aposentar.
Nesse ínterim, deputados sórdidos
descaradamente trocam seus votos de uma pauta tão relevante por emendas
parlamentares oferecidas pelo governo a toque de caixa e a Federação da
Indústria numa desfaçatez insolente por meio de seus bichos infláveis diz que o
empresariado “não pagará o pato” nem “engolirá o sapo”. E a título de
constrangimento, na votação em primeiro turno, o deputado federal de Americana,
Vanderlei Macris, votou a favor dessa reforma obscena que nos empurra goela
abaixo a destruição de nossos direitos.
[1] ANFIP. Análise
as Seguridade Social em 2017. https://www.anfip.org.br/wp-content/uploads/2018/12/Livros_28_11_2018_14_51_18.pdf
[2] Senado Notícias. Empresas privadas devem R$ 450
bilhões à Previdência, mostra relatório final da CPI https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2017/10/23/empresas-privadas-devem-r-450-bilhoes-a-previdencia-mostra-relatorio-final-da-cpi
[3] Carta Capital. MTST ‘compra’ em loja da Havan e paga
com cheque da dívida de Hang https://www.cartacapital.com.br/sociedade/mtst-compra-em-loja-da-havan-e-paga-com-cheque-da-divida-de-hang/
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