quinta-feira, setembro 08, 2011

Uma conversa de facebook

Já que esse blog é construído e esboçado hoje a fim de trazer ao leitor um discurso manifesto, penso nas múltiplas possibilidades de explorá-lo. De maneira à melhor atender seus objetivos. Obviamente, concluo que os diversos discursos serão da maior valia para uma construção da reflexão humana, pautada nas diferentes perspectivas e realidades, as quais convivem no mesmo espaço e/ou diálogo.
Bem, recortei e colei uma conversa trocada numa rede social na data desta postagem. Os nomes são fictícios, de forma a preservar a identidade de seus autores. Registro, ainda, minha profunda admiração por Gláucia, precursora desse debate que possivelmente não terminará num ponto final. Certamente, aqueles que participaram da conversa, bem como aqueles que a leram, darão continuidade, nem que seja no dia seguinte ou daqui dois anos, quando pensarem em todas ou uma das perspectivas e realidades contidas em cada discurso.
A linguagem e compreensão do mundo é assim: processo.
 ***
GLÁUCIA: "Essa é uma forma de dizer que país queremos, com moralidade e justiça. É um grito que precisa ser ouvido (...) A classe média saiu de casa e veio para a rua. Foi assim com as Diretas-Já e com o impeachment. É assim que começa", disse o presidente da OAB durante a marcha.
ROGÉRIO: Começa o quê mesmo?
TATIANE: é assim que começam novas amizades e tal, mais amigos no facebook, mais fofocas sobre a vida dos outros, essas coisas...
ROGÉRIO: Ah, tá, só se for...
JOÃO: É assim que começam a vender dindins/geladinhos tão deliciosos quanto os de goiaba e de coco que chupamos hoje...
GLAUCIA: Vamos lá.
Ficha Limpa - o projeto circulou por todo o país, e foram coletadas mais de 1,3 milhões de assinaturas em seu favor – o que corresponde a 1% dos eleitores brasileiros (a iniciativa popular - prevista na Lei Magna - só se efetiva ...como PL quando se apresenta ao menos 1% de assinaturas de todos os eleitores do país);
Diretas já - movimento popular/civil de reivindicação por eleições presidenciais diretas no Brasil ocorrido em 1983-1984, depois de anos de regime de ditadura (na maior manifestação pública da história do país, a Praça da Sé recebeu mais de 1,5 milhão de pessoas);
Impeachment - movimento popular de maioria estudantil - os caras-pintadas - exigindo o impeachment de Collor, acusado de corrupção, lavagem de dinheiro, além de não ter conseguido controlar a inflação “quase exponencial” de 80% ao mês e custosos gastos públicos. O último dos encontros reuniu mais de 750 mil no Vale do Anhangabaú;
Parada LGBT de SP – evento anual de orgulho gay, considerada a maior do mundo – recordes de mais de 3 milhões de pessoas -, que reivindica especialmente o combate à homofobia, dentre outros direitos civis, a exemplo do tema do ano de 2009: “Pela Isonomia dos Direitos”. A maior vitória foi certamente a decisão do STF, ainda há pouco, pelo reconhecimento da união estável de casais homossexuais;
Cada vez mais eu tenho a certeza que só se “começa” uma mudança (ainda que pequena) pelo impacto de um grande público. Esses exemplos corroboram aquela máxima, por vezes usada de maneira prosaica, de que “a voz do povo é a voz de Deus”. 1,3 milhão para Ficha Limpa, 1,5 milhão para Diretas, 750 mil para Impeachment, 3 milhões na Parada Gay, etc. Ainda tem a Marcha das Margaridas, Marcha das Vadias, Marcha contra a corrupção...
Dizer que a Marcha da Av. Paulista só teve quorum porque a tal “classe média” não iria viajar num feriado de meio de semana - e por mais que eu tenha severas críticas à (limitada) amplitude classista, étnica, racial e de gênero desses movimentos - me parece de uma tamanha mesquinhez, reacionarismo e conformismo, sem igual. Chega a me dar asco.
OSCAR: Mudanças Sociais no Brasil :D É sempre bom acreditar nelas. Desmonte de ditaduras no norte da África, reivindicações em países europeus questionando a crise econômica crônica, marchas contra corrupção, passeatas pela descriminalização da maconha, paradas pela diversidade sexual e de gênero, manifestos por um mundo mais justo são sempre bem vindos para contestar um sistema econômico e social. Independente dos motivos, o exercício de ir às ruas (espaço público, não privado) já é um avanço incrível nesse contexto que nos assola e oprime TODOS OS DIAS e que nos deixa presos a tantas amarras e pudores frente a transformação. Glaucia, procure o artigo do Arnaldo Jabor que saiu na última terça (6), no caderno 2 do ESTADÃO. É muito bom. Eu adorei.
GLAUCIA: Esses "intelectuais" me dão gastura. hhahaha Mas verei.
ROGÉRIO: Nossa agora meu sensor deu tilt: uma série de argumentos revolucionários redundaram no Jabor. Bizarro! E mais: Jabor = intelectual? Desculpa, não entendi mesmo mais nada agora.
Glaucia e Oscar, toda glória à manifestação popular, óbvio! O que merece ser bem pesado é a real capacidade desses movimentos - muito mais performáticos do que transformadores, além de ser inteligentemente captados pelos jornalões, do jeito... que lhes convém - nos levarem à redenção contra corrupção, safadeza, preconceito, racismo, etc! A catarse coletiva fica muito bem na foto; manter o espírito de mudança, no dia a dia, é algo que custa bem mais (e dá muito menos IBOPE). E de hipocrisia, meus caros, o mundo tá cheio! Grande e sincero abraço!
OSCAR: É, (de fato) na sociedade do espetáculo, o que importa é a performance. Já dizia certa rainha "mais do que ser, é preciso parecer". Assim, como parte dessa sociedade, penso que olhar para o mundo e seus defeitos é também olharmos o que temos de sua podridão. Usemos de suas armadilhas como nossas armas. Até podemos dar um tiro no pé, mas assim teremos um exército numa luta que é de todos. O texto do Arnaldo Jabor retrata bem o espírito e ideologia que se dissolvem com o tempo, seu saudosismo talvez seja desse espetáculo de outrora. E se há saudade, é porque, de alguma forma, ele acredita que ali existiu algo que ultrapassava a performance. Nem que seja uma ótica burguesa, pra mim, até a ilusória mudança social se pensada/feita por qualquer coletivo é válida. São munições para revoluções além dos microespaços, tão desgastantes a todos aqueles tentam colocá-las na prática.
GLAUCIA: Endosso a leitura de: A sociedade do espetáculo - do francês e neomarxista Guy Debord. A luta de classes contemporânea se revela e se reproduz diariamente na aparência, enquanto a melhor forma de apartar as classes. Mais do que ser burguês, é preciso parecer burguês. Mais do que não ser proletariado, é preciso não parecer proletariado. Ora, isso põe em xeque ou acalora o debate acerca de nossas militâncias. Será que a performance faz menor a causa? Confesso que me senti usurpada quando soube, há pouco, que o PSDB estava na manifestação de ontem filmando e fotografando este “furo de reportagem” para seu programa partidário. E igualmente estarrecida com a abordagem dada pela Veja – PiG-mãe do inferno! – na reportagem sobre o pré e pós marcha (me lembrou o próprio Impeachment, incentivada em rede nacional pela TV do Marinho). 
Embora todo o ceticismo de Carta Capital ,
http://www.cartacapital.com.br/politica/a-revolucao-nao-partira-do-vao-livre-do-masp e também de outros veículos centro-esquerda, só me reafirme a ânsia pela crítica ao “movimento da classe média cansada” (que dó de você!) e pelo debate acerca da “classe média hipócrita”, não poderei deixar de concordar com Oscar, quando diz que: “até a ilusória mudança social se pensada/feita por qualquer coletivo é válida” (pondero apenas o pronominal “qualquer”, não posso ser tolerante a todo tipo de coletivo!). Aliás, se é para relativizar, chega a ser mais nonsense ainda os “medianos” (em classe e em pró-atividade), que assistem a marcha pela Rede Globo, julgam-se politizados ao censurar uma marcha forjada e, honestamente, não se interessam e nem conseguem mobilizar a luta contra a corrupção e impunidade no seu cotidiano.

2 comentários:

disse...

A cada linha relida nesse post, só tive a certeza de que "juntos, somos mais fortes".
Me emocionei.

disse...

Ah claro. Gláucia e Oscar, esses são eternos.